sábado, 26 de janeiro de 2008

Meu Perdido Diário – Página 7

Histórias soltas de uma brasileira na terra dos saiotes xadrezes

Finalmente vi uma banda de gaita-de-foles. Uma dúzia de gaiteiros devidamente travestidos, tocando num salão de hotel (quem quiser conferir, fiz um vídeo e coloquei em http://www.youtube.com/watch?v=u0KQ-finBMc).
Um aviso: uma gaita-de-foles já é suficiente pra enlouquecer quando tocada num ambiente fechado. Com uma dúzia, você se pergunta por que os EUA testaram a bomba em Hiroshima e não em Edinburgh.
No meio da apresentação, meu sistema auditivo pediu demissão. Mas o pedido não foi processado porque houve uma pane generalizada no cérebro, devido à exposição prolongada a altas freqüências, sem contar com a “Ode ao Haggis”, poema que o alto dignatário do jantar recitou antes de descer a espada (literalmente) na buchada que estava à sua frente.
Pra quem não conhece, Haggis é um prato típico da Whiscócia, feito de bucho de carneiro, fígado de carneiro (não sei se usam outras coisas do carneiro, eu não perguntei porque sou tímiida), aveia e banha em pedaços. É posto inteiro no centro da mesa, quando o anfitrião gentilmente desembainha sua espada (loucura loucura loucura) e, com a graça e delicadeza de um rinoceronte, desce a lâmina naquele pedaço marrom de forma indefinida. Coisa muito fina. Ainda não pesquisei a fundo a origem desta iguaria, mas tenho minha teoria: nos idos do século XIII, McKoysa, um pacífico pastor de ovelhas do norte caledônio tem sua fazenda invadida por carneiros selvagens furiosos assassinos, que barbaramente destroem seus pertences, bebem seu malte e comem suas ovelhas (que não reclamaram muito do fato). Próximo a cair em pranto desesperado, eis que, estupefacto, McDhroga vê o pior dos atos: os carneiros ninja mutantes assassinos pisam com os cascos sujos de esterco em seu tartan!
McMherd em fúria insana apanha sua espada (ainda não sei direito por que um pastor de ovelhas pacífico teria uma espada. Mas vou pesquisar) e, numa performance digna de Matrix, O Tigre e o Dragão e Charlie’s Angels, mata todos os carneiros, e manda suas ovelhas vestirem a lã, pois afinal aquela é uma fazenda de família.
Para celebrar a vitória do bem sobre o mal e, principalmente, pra fazer um dinheirinho extra com as sobras, McKhorno recolhe os despedaçados carneiros, joga tudo na panela e vende pros vizinhos.
Antes que vocês comecem a achar que eu dei foi uma baita desculpa furada pra cima de todos com essa história de emprego no exterior, e que na verdade eu me mandei pra cá foi pra poder cheirar Nescau impune, quero lembrar-lhes que eu estou em Aberdeen, não em Amsterdããããããã.
Além do mais, a empresa faz testes toxicológicos, pra garantir que não vai ter nenhum maluco comendo petróleo com farinha no meio da larica. Ou seja, o barato sai caro.
Tudo o que vocês leram veio de longas horas de pesquisa em arquivos obscuros e fontes que pediram para serem mantidas incógnitas. A menos que haja a chance de aparecer na Oprah e ganhar umas libras a mais.


E vamos todos lutar por um mundo melhor! Contribua para a campanha internacional FAÇA UMA JAQUE FELIZ: embrulhe um abraço em plástico-bolha e mande para a caixa-postal que está aparecendo na sua telinha!
O quê? Não ‘tá aparecendo caixa-postal nenhuma na sua telinha? Tem certeza? Já tentou ajustar o vertical? O horizontal? A diagonal? O eixo da Terra? Nada? Nem um endereçozinho?
Saco! Odeio engenheiros de telecomunicações!


Jaqueline Costa
Que tem uma pequena sugestão acerca de gaitas e foles

quinta-feira, 24 de janeiro de 2008

Meu Querido Diário – Página 6

Alguém na Escócia esqueceu de pagar a conta do aquecimento global


Os britânicos sempre nos passaram a impressão de frios, impassíveis, sem emoção. Agora que estou no meio deles, vejo que não é bem assim. Na verdade, eles são extremamente passionais – mas só na hora de publicar notícias nos jornais.
Você conversa com eles e tem a nítida impressão de que está falando com a pia do banheiro – mais aí se dá conta de que não, a pia provavelmente mostraria mais reações. Mas se você resolve dar uma espiada no matutino, fica impressionada com a quantidade de pontos de exclamação e letras vermelhas garrafais usados nas manchetes – isso para lhe informar coisas como “Sarah Parker revela drama: ‘Devo minha vida a Scott McKay!!!’ “.
Abocanhada por essas palavras (e pelas letras vermelhas garrafais), você ávida lê a notícia – e descobre, só lá no segundo parágrafo, depois de uma torrente de frases dignas de uma novela mexicana, que Sarah Parker é uma das finalistas do “Dança no Gelo”, Scott McKay é o produtor do programa, e ela lhe deve a vida porque antes de ser convidada para o show estava devendo duas prestações do carro.

Resolvi tentar cortar o cabelo – começo a ficar parecida com um Iéti. Entrei num salão meia-boca, perguntei quanto custava um corte – um tantinho só, uns 3 ou 4 dedos. Sem demonstrar o menor medo de ser presa por atentado ao pudor, a moça me disse “noventa libras”.
O problema do inglês é que é uma língua muito, digamos, comercial. Tudo pela simplicidade. É ótimo como esperanto dos tempos modernos, mas sua falta de expressões e emoções às vezes é podante. Como naquele momento. Incapaz de expressar o que sentia no idioma do bardo, voltei-me para a língua pátria e, num português irretocável, virei para a atendente e disse: “nem fudendo”. A senhora, uma pobre ignorante da beleza da última flor do lácio, não pôde captar todo o significado de minha profunda frase, sendo fadada a apenas apreciar o melodioso som de minhas palavras.
A falta de expressão nesta língua está me tornando uma pessoa mais calada – sortudos esses escoceses! Aliás, não é só nisso que meus hábitos estão mudando. Se antes eu tinha pavor de lugares fechados (praticamente uma claustrofóba!), e pânico de ficar em casa e ir cedo pra cama (Freud explica), agora eu sou uma habitué de clubes, bares e qualquer outro lugar – meu quarto incluso – que mantenha as portas fechadas e o frio do lado de fora. Some a isso minha pele assumindo um tom pálido, os longos casacos com as golas levantadas pra criar uma pseudo-barreira ao vento, e os cachecóis escondendo parcialmente meu rosto, dá pra se imaginar que criatura soturna eu estou virando. Aliás, tenho um medo que me pélo de acordar pela manhã e descobrir que meus caninos estão crescendo!
Se bem que uma vampira vegetariana seria um ineditismo no mundo, hein? Se bobear eu viro série da Sony.


Jaqueline Costa
Ainda na busca de Willy Wallace, ou qualquer um que se pareça com Mel Gibson

sábado, 19 de janeiro de 2008

Díário de Bombordo – Página 5

Curtinhas


Esta noite sonhei que estava no Brasil, chegando à casa de meus pais de táxi.
O táxi párou na porta da casa, total da corrida: seis e vinte. Quando eu me preparava pra pagar, meu despertador começou seu escândalo matinal. Seis e vinte da manhã!
Nunca vi uma maneira mais ridícula de dizer que tempo é dinheiro. O que me leva a concluir que eu sou uma palhaça até no subconsciente.

A sueca peituda voltou a atacar... ela comentava como achava irritante que as pessoas não vejam problemas em dançar se estão bêbadas, mas se você está sóbria e começa a dançar eles olham meio de lado. Eu respondi que achava tudo muito estranho quanto a isso também, mas não dou a mínima para olhares – na verdade eu sou pessoalmente responsável pela continuidade dos miicos, estes animais tão graciosos, ameaçados de extinção pela sociedade. Mas isto eu não consegui explicar em inglês. E nem precisei – bastou dizer que achava normal dançar para a menina colocar a música no máximo em seu laptop (estávamos em casa), levantar e iniciar uma performance digna do Village People!
Não sei que pozinho ela coloca na pipoca, mas começo a achar que não é sal...

Gente, o que significa Elseve? Vocês sabem, Elseve, aquele shampoo... o que significa?
Eu achava que era só algo que o dono da empresa tinha lido em sua sopa de letrinhas, numa noite em que sua mulher não quis cozinhar porque estava em pânico graças ao efeito abre-alas do seu cabelo, mas... eis que eu olho aqui e encontro o shampoo Elvive! Mesma embalagem, mesmo logotipo, mesmas letras, mesmo fabricante... Elvive, e não seve!
Ainda não encontrei gatorade por aqui. Meu aproveitamento nas atividades físicas permanece o mesmo, mas sair da ressaca está ficando mais difícil.

E eis que eu leio n’O Globo que o digníssimo governador do meu amado estado pensa em baixar um decreto proibindo a garupa nas motos. Segundo Vossa Genialidade, isto acabaria com os moto-assaltos, esta nova moda que faz parte do dia-a-dia das cidades mais antenadas com o mundo fashion – fashion-olhos.
Faz todo o sentido. Imagino que agora todos os assaltantes estão em casa, desesperados, pensando no que fazer – vão ter que pensar num outro modo de ganhar a vida, pois do contrário estarão arriscados a tomar uma multa!
Não vou nem entrar no mérito de que se assaltantes obedecessem a leis, não seriam assaltantes... Parece aquela do sujeito que chegou em casa e viu a mulher o traindo no sofá da sala. Resoluto, vendeu o sofá!

Outro fim-de-semana, outra ida à Igreja. Dessa vez, 3 pistas de dança numa catedral gótica.
Me pergunto onde esse povo vai quando quer rezar...


Jaqueline Costa
De passagem
E com excesso de bagagem!

quinta-feira, 17 de janeiro de 2008

Diário de Bordo - Página 4

A Velha Escócia sob uma Visão Tupiniquim



Até que viver num país gelado não é difícil. E tem as vantagens de gelar a cerveja na janela, o sorvete não derrete (em alguns momentos, nem na boca), e aqui faz sentido pedir vinho na temperatura ambiente.
Além do que, depois de um tempo você se acostuma e até dá pra fazer amizade com pingüim. O único problema é sair com eles, esse negócio de usar roupa social toda noite pra combinar com o smoking.
Mas se eu achava que a cidade era fria, é porque eu ainda não tinha visitado o mar...
14 dias embarcada, e vai ser frio assim na caledônia que pariu!
E o vento... tenho certeza que o túnel de vento da Nasa não chega perto daquilo!
Dava pra andar fazendo 20o com a normal fácil! O vento sustentava.
Bem, sustentava até o momento em que mudava de direção. Quase-tombos inúmeros durante a quinzena.
Aliás, toda vez que eu tinha que caminhar nessa ventarola, eu pedia pro vento ser contra. Porque aí era só inclinar o corpo pra frente e andar, sem perigo de perder o equilíbrio. Se não for contra, eu pedia, então que seja a favor. Inclinava o corpo pra trás, um pouco mais complicado, mas tudo bem. Agora, quando o vento era de ladinho, ai caraca...
Algumas vezes eu até fui atendida nos pedidos. O único problema é que aparentemente meu gênio da lâmpada é do tipo shareware... a direção pedida não durava mais que 30 segundos, e quando eu estava andando, segura de mim e das minhas passadas... UEEEEEEEEEEEEPA, vento de ladinho!
E os telejornais mostravam extasiados que o hogmanay em Londres reuniu 700 mil pessoas. Nooossa... fiz cara de pouco caso e mencionei, distraidamente, que Copacabana bateu 4 milhões. Hehehehe, sou má!
Não mencionei os tiroteios e assaltos, que eu não estou aqui pra entregar o ouro pro bandido. Mesmo os bandidos sendo louros de olhos azuis...
Mas voltei pra casa, e descobri que instalaram uma tv lcd no meu quarto – e no da sueca peituda não! Aha! Eu eu eu, a sueca se deu mal!
Aliás, como meus amigos têm perguntado bastante sobre esta personagem das histórias, vamos aos fatos: SIM, ela é sueca. SIM, ela é gigante. SIM, ela é peituda. NÃO, ela não é bonita. NÃO, ela não tem bunda. NÃO, ela não é magra. E SIM, ela já tem namorado – diga-se de passagem, um cara bem mais sociável que ela.
E NÃO, eu NÃO peguei o namorado sueco da sueca peituda.
Ele é baixinho...

Jaqueline Costa
Procurando Willy Wallace

quarta-feira, 9 de janeiro de 2008

Díário de Bordo – Página 3

Histórias de uma brasileira perdida na Whiscócia


O frio aqui ainda está suportável. Na verdade, está um frio estilo “Putaquepariu!”. Mas, pelo que li no boletim meteorológico, lá pelo Ano Novo estará na base do “Pu-ta-que-o-pa-riu!”, assim, separando as sílabas por entre dentes.
Se chegar no nível de soletrar, acrescentando um “ccccccaaaaaraaaaalhooooooooo”, eu volto pro Brasil.
Sábado foi dia de visitar a paróquia. É, crianças, aqui em Aberdeen é fácil se tornar uma pessoa carola. Sobretudo pelo fato de que o bar mais cool do pedaço funciona dentro de uma Igreja! Inacreditável!
O altar é o lugar do DJ, um mané escocês que não tem uma música latina dentro da manga.
Europeus na night são um espetáculo à parte. 99% não dançam, o único movimento é o do levantamento do whisky. Os 1% restantes (basicamente os que encheram a cara o suficiente para perderem o bom-senso) se divertem subindo no balcão, ou mostrando a bunda branca – coisas que não são muito bem aceitas pelos seguranças, armários triplex que surgem das sombras e carregam os bebuns sei lá pra onde.
A comida também é um destaque. Não há modo de beber um suco de laranja decente – então eu não bebo suco de laranja aqui. E eles fazem uma espécie de salada de maionese em que, no lugar das batatas, colocam repolho picado. Não creio que seja muito bom para a vida social, mas, enfim...
Também se amarram em baked beans: feijão (branco) cozido com molho de tomate. Comem de manhã, de tarde e à noite.
Levando em conta também a salada de repolhos, já se pode dizer que a Escócia é auto-suficente na produção de gás natural. Ecológicos estes caledônios.
A sueca peituda vai bem. Mas está começando a me olhar meio estranho por me ver tomar banho duas vezes por dia. Deve pensar que tenho doença de pele.
Ou que não existe água encanada no Brasil, e isso pra mim é uma novidade.
Há alguns dias vi a cena mais bonitinha até agora de Aberdeen: sete e pouca da manhã (ou seja, ruas completamente escuras) e um cachorrinho saiu de uma casa, apanhou o jornal na calçada, e levou-o para o dono.
Fiquei lembrando da minha pequena Mayla, pensando em treiná-la para apanhar o jornal. Mas aí lembrei como a danada é friorenta. Num dia como os últimos, com o termômetro fazendo força pra alcançar 1oC, eu estou certa que ela vai olhar-me seriamente nos olhos e passar a mensagem subliminar: telejornal, telejornal, telejornal...

E está lançado o desafio: o primeiro que vier me visitar, trazendo um conjunto de manicure e uma caixa de mate, ganha uma garrafa de Jack Daniels!


Jaqueline Costa
Ho Ho Ho!
E uma garrafa de rum

Uma Emocionante Saga em Busca da Piada Perfeita

"As Páginas do Díário" surgiram meio por acaso, da união de minha paixão por escrever com a necessidade de responder a meus vários muitos amigos a eterna pergunta que não raro pululava em minha mailbox: "onde é que você tá, mulher?"
Pra não responder um por um, os relatos das viagens foram iniciados, e enviados para uma lista de amigos. Um interessante efeito bola-de-neve começou, com amigos mandando os textos para outros amigos, e a lista foi aumentando. Com tanta gente que nem me conhece querendo ler as besteiras que escrevo, só posso concluir uma coisa: como tem gente boba neste mundo! ! !
Para não correr o risco de perder os textos, resolvi colocar tudo na net, para referências futuras, que não serão aceitas como prova por nenhum juiz.
Claro que isto não significa que vou deixar de mandar as páginas do diário por email para meus diletos, seletos, concretos e infelizes leitores!

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